Crônica da semana: NOSSAS MULHERES NÃO DEIXAM

  Wagner Fontenelle Pessôa                     
            Essa confusão toda, na qual se encontra mergulhada a população capixaba e que tem levado o Espírito Santo a uma situação caótica, em termos de segurança pública, além de uma completa inversão da ordem e dos valores, motiva que eu me afaste, pelo menos no dia de hoje, do estilo habitual com que encerro os meus textos neste espaço.
            Posta de forma simplificada, a situação é a seguinte: os policiais militares daquele Estado abriram mão do seu papel estratégico e de sua autoridade, admitindo que os marginais — pertencentes ao crime organizado ou não — pela inércia da PM e abandono das tarefas que lhe cabem, poderiam agir, segundo sua própria vontade. Enquanto isso, os membros da corporação, aquartelados nos seus respectivos batalhões, usam como escudo os contribuintes que lhes pagam os salários, além de se esconderem por trás de suas mulheres, mães ou irmãs, para não fazerem o que é de sua obrigação.
            Ao fazerem isto, demonstram que não sabem distinguir o seu indiscutível direito de pleitear melhores salários e condições de trabalho para a categoria — que a a sociedade, por certo, haveria de apoiar — da prática de delitos, previstos pelo Código Penal e pelo Código Penal Militar. Crimes que se materializaram na conduta de suas mulheres, por tentarem impedir o funcionamento de um serviço público essencial, assim como pela forma covarde como os próprios policiais militares decidiram entregar os capixabas às feras, com o propósito de pressionar o governo do Espírito Santo a atender suas reivindicações salariais.
            Como estrategistas, evidenciaram um total desconhecimento do campo de batalha e das variáveis da luta em que se meteram. Porque, imaginando que, premida pela situação angustiante, a população civil espírito-santense iria juntar-se ao coro dos que gritam em favor de suas pretensões, estão redondamente enganados. A única voz que ouvirão dos capixabas e de muitos outros brasileiros, é a de que não pode haver anistia para quem descumpriu a lei, a ordem judicial e submeteu os cidadãos desarmados a uma situação de terror.
            Mas, o que dizer dos comandantes da PM-ES? Estão coniventes com tudo isso ou foram verdadeiramente desautorizados pela tropa? Sendo por um ou por outro motivo, deveriam demitir-se. Ou, se não o fizessem, deveriam ser destituídos, porque os pilares de uma organização militar são a ordem, a disciplina e a hierarquia. E um comandante que não é capaz de assegurar essas três coisas, numa estrutura sob seu comando, é porque não está capacitado para o posto.
            Ninguém deseja que a Polícia Militar seja formada por profissionais truculentos, que apelem, desnecessariamente, para o uso da força bruta. Todos queremos policiais preparados, qualificados, reciclados de forma periódica e, por evidente, bem remunerados. Do mesmo modo também se almejam salários e condições de trabalho adequadas para todas as demais categorias de servidores públicos. Em contrapartida, também não é admissível que policiais se amotinem e submetam os cidadãos, a quem deveriam proteger
, a uma condição de reféns da criminalidade, pela avaliação equivocada de que, assim, forçarão o governo a atender suas exigências.
            O que fariam esses policiais e as mulheres de suas famílias — essas mesmas que estão fazendo "paredinha" para que eles não saiam dos quartéis — se levassem a um posto do SUS algum filho, em situação de emergência, mas os médicos lhes dissessem que não dariam assistência à criança, porque estão pressionando o governo por um aumento salarial? E se lhes fosse explicado que os médicos não se recusam a atender, mas suas mulheres é que estão na porta, impedindo que eles entrem para trabalhar? Achariam compreensível, criativo ou astuto, da parte do pessoal da saúde, como estão considerando a sua própria desculpa esfarrapada?
            Na caserna, ao que se saiba, o final de um motim é sempre a punição exemplar. E é isto o que espera a população brasileira, como forma de desestímulo a outras aventuras como essas, pelo país afora. Vamos ver no que vai dar essa encenação de péssima qualidade — da peça "Nossas mulheres não deixam" —  levada à população capixaba no palco da Polícia Militar do Espírito Santo.

            Por enquanto, a única certeza que todos podemos ter é a de que nunca, antes de agora, a bandidagem que atua no território do Espírito Santo aplaudiu as ações da PM, naquele Estado, com tanto entusiasmo!

Um comentário

Anônimo disse...

Minha sugestão aos policiais, é que, em protesto pelos baixos salários, se recusem a fazer segurança aos magistrados, aos políticos etc.